domingo, 15 de fevereiro de 2009

"Reconstrução do Pai Destruição do Pai", Louise Bourgeois, SP, Cosa&Naify Edições, 2000.

É preciso ter diferentes rotinas para sobreviver... geometrias diferentes.

Você se preocupa com tudo o que faz.
Você desvia o olhar das coisas difíceis de fazer.
Você sempre inventa desculpas.
Você acha que está sempre certa.
Você carece de autoconfiança.
Você não enxerga o ponto de vista dos outros.
Você evita as pessoas, vive demais para dentro de si.
Você não tem uma finalidade na vida.
Você carece de interesse pelas coisas.
Você tem surtos de raiva.
Você circula por aí com cara de amuada.
Você descuida de sua saúde física, aparência.
Você não é tolerante e não tem controle sobre suas emoções.
Você é incapaz de amizade.
Você não consegue rir das situações e de si mesmo -

Tudo dá lucro, exceto sonhar – sonhar amolece e torna as pessoas incapazes para o trabalho diário. É difícil ser artista e fechar a porta para os sonhos.

Exílio ou alienação são (mesmo que ainda insuficientes) condições necessárias para poder trabalhar.

O que provoca o nascimento da obra? Qual o impulso primário? O que faz o artista trabalhar? É para fugir da deperessão (preenchendo um vazio)? É para registrar confiança ou prazer? É para entender e solucionar um problema formal e reordenar o mundo? O que eu queria era sobretudo um mundo ordenado.

Eu não tinha a segurança de qualquer tipo de religião, e afinal foi por isso que me tornei artista – para encontrar um modo de sobreviver.

Perdoe e esqueça, dizem – o nome de uma peça. Eu não perdôo nem esqueço. É o moto que abastece meu trabalho. Estou vibrando como uma folha. Não quero falar do passado, quero falar do futuro.

Autocontrole significa:
Não mostre sua flecha, idiota.
Não faça ameaças, estúpido.
Não assuste cavalos.
Não balance barcos.
Não provoque um ataque.
Não demonstre seu ciúme.
Não mostre o quanto se importa.

Você sabe que não tenho receita para nada.

Bem, o objetivo de The destruction of the father era exorcizar o medo.

Meu estilo, minha maneira de trabalhar vem de todos os fracassos, todas as tentações a que resisti, toda a diversão que não tive, todos os arrependimentos. O estilo é feito uma estátua que você dilapida - é feito de todas as coisas de que você abdica. Todas as coisas que você deseja intensamente e às quais diz não.

Eu preciso de minhas memórias. Elas são meus documentos. Eu as vigio. São minha privacidade e tenho um ciúme intenso delas. Cézanne disse: "Tenho ciúmes de minhas pequenas sensações." Lembrar-se e devanear é negativo. É preciso diferenciar entra as lembrançasa. Você vai na direção delas ou elas vêm em sua direção? Se vai a elas, está perdendo tempo. A saudade não é produtiva. Se elas vêm a você, são as sementes da escultura.

Se uma pessoa é artista, é uma garantia de sanidade. Ela é capaz de suportar seu tormento.

O medo é o inferno. É paralisante. Minha escultura me permite reexperimentar o medo, dar-lhe um caráter físico para que eu possa destruí-lo. O medo se torna uma realidade manipulável. A escultura me permite reviver o passado, ver o passado em sua proporção objetiva e realista.

Em nossa recusa a enfrentar o medo, recuamos para a nostalgia. O medo nos condena à rejeição do presente. O presente se mantém intolerável. Devemos pedir ajuda ao passado para solucionar os problemas do presente.

Precious liquids (peça de 1992) Gravada em aço sobre a entrada para a peça há uma inscrição que diz: "A arte é uma garantia de sanidade". Eu não disse que é a garantia de sanidade. Há muitas outras. A arte é apenas um modo de se atingir um equilíbrio - de se tornar uma pessoa sociável.

O presente destrói o passado todos os dias.

O trabalho alivia um estado de dor momentânea.

O que é felicidade? É uma palavra muito boa; felicidade significa um certo tipo de equilíbrio. Significa que você pode alcançar certa aceitação de si mesmo e dos outros.

Conversar significa trocar memórias.

Disciplina. Acredito na disciplina. Como você pode se tornar um músico se não for disciplinado? A disciplina também é uma questão de compreender a si mesmo. E resistir à tentação, resistir aos demônios.

É realmente uma obsessão, a obsessão do medo de desperdiçar tempo. Eu tenho essa obsessão.

Tempo - o tempo vivido, o tempo esquecido, o tempo compartilhado. O que o tempo inflige - pó e desintegração? Minhas reminiscências me ajudam a viver no presente, e quero que elas sobrevivam. Sou uma prisioneira de minhas emoções. É preciso contar sua história, e é preciso esquecer sua história. Você esquece e perdoa. Isso o liberta.

Meu nome é Louise Josephine Bourgeois. Nasci em 24 de dezembro de 1911, em Paris. Toda a minha obra dos últimos cinquenta anos, todos os meus temas, foram inspirados em minha infância.

"Reconstrução do Pai Destruição do Pai", de Louise Bourgeois, SP, Cosac&Naify Edições, 2000.

2 comentários:

Anônimo disse...

Sonia, li com bastante atenção os textos que publicou, de Louise Bourgeois. Muito interessantes.
"Conversar significa trocar memórias"... E não é que é mesmo?
Gostei demais do novo blog. Você foi egoísta (no bom sentido) mantendo-o "escondido" por algum tempo... Achei estranho, pois quando fui aos seus dois outros espaços não encontrei O TEMPO...

Meus parabéns pela participação.
Um abraço fraternal.

sonia a. mascaro disse...

Boa tarde Rogerio Castro,

O livro é muito bom mesmo, mas eu não tenho mais.
Talvez você possa encontrá-lo em sebos.

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