sábado, 4 de julho de 2009
O Pão, de Francis Ponge
A superfície do pão é maravilhosa em primeiro lugar por causa dessa impressão quase panorâmica que dá: como se tivéssemos à nossa disposição ao alcance da mão os Alpes, o Tauro ou a Cordilheira dos Andes.
Assim, pois, uma massa amorfa a arrotar foi introduzida para nós no forno estelar, onde endurecendo se moldou em vales, cristas, ondulações, gretas... E todos esses planos logo tão nitidamente articulados, essas lajes delgadas onde a luz com aplicação deita seus fogos, - sem um olhar sequer para a moleza ignóbil subjacente.
Esse frouxo e frio subsolo que se chama miolo tem seu tecido semelhante ao das esponjas: ali folhas ou flores são como irmãs siamesas soldadas por todos os cotovelos a um tempo só. No pão amanhecido essas flores murcham e encolhem: desprendem-se então uma das outras, e a massa torna-se friável...
Mas partamo-la: pois o pão deve ser em nossa boca menos objeto de respeito que de consumo.
Trad. Ignacio Antonio Neis e Michel Peterson
O Partido das Coisas, de Francis Ponge, Editora Iluminuras Ltda, São Paulo, 2000.
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2 comentários:
Não conhecia esse escritor. Que encantamento ele trás na sua linguagem
Fico emocionada em ler esses grandes intelectuais que enxergam de uma forma tão especial as coisas habituais no nosso cotidiano, e faz disso uma verdadeira obra de arte literária.
Esse é o verdadeiro saber.
Sonia você tem feito muito por nós com o seu conteúdo cultural.
Obrigada.
Beijos.
Esta analogia entre o pão e o universo é muito interessante e pertinente. Realmente ambos nos fornecem o que precisamos para sobreviver...e viver.
Mais uma dica maravilhosa, eu não conhecia este autor.
Um grande beijo.
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